Poucas vezes me senti tão atraída por alguém que não me despertasse um tesão intelectual. Mas ele, apesar de não ter lido Bachelard, tem a sensibilidade de conversar com plantas, bichos, abraçar árvores, e uma docilidade sem tamanho. É tudo muito simples: me olha com admiração e se preocupa se estou confortável onde quer que estejamos. E promove este conforto. Não sou insegura, mas ele tem um abraço que me blinda de qualquer medo. Porque guarda nos olhos essa tranquilidade que carrega na alma. Ele ri de qualquer excentricidade minha, topa qualquer cena em público de brincadeira e caímos na gargalhada juntos, vendo as pessoas boquiabertas. Ele tem o charme e a beleza que nunca vi em ninguém. E o melhor: não sabe disto. Nunca se vangloria por nada. E o que não leu, adora que eu leia para ele, e se emociona porque acha o trecho mais bonito em minha voz. Ele acha que eu absorvo o texto e vou encontrando peculiaridades tão sutis no contexto que seus olhos marejam. E ele me explica isto de um jeito muito delicado: sorri comovido e diz “que bonito, Meu Deus, como é bonita a cena toda: você, sua voz, sua paixão pela leitura, os trechos que você escolhe...”
Eu o abraço, porque não sei agradecer coisas tão grandiosas. E nunca analisamos se o que sentimos é amor, nunca tentamos dar nome aos nossos sentimentos. A gente se quer muito bem, isto é explícito. E a vontade de estar junto não acompanha qualquer dependência ou obsessão, nossa individualidade é respeitada e tem vida própria. Mas a gente gosta de ter qualquer parte do corpo sempre encostada na pele do outro. A gente gosta de batata frita com sorvete e água com gás. A gente gosta de imaginar que as estrelas cadentes vão cair nas nossas testas. A gente gosta de deitar na areia à noite no meio da praia e falar de vagalumes e planetas e marés... A gente vive se colorindo de fantasias pueris só para poetizar nossos instantes. E é com ele que eu tenho vontade de colocar uma pequena mochila nas costas e desbravar todas as paisagens internas, externas, e desaparecer dentro delas.
Marla de Queiroz
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