Enquanto eu disfarçava os meus olhos marejados, as mãos ansiosas arrancavam o esmalte das unhas. E a tentativa de resgatar todos aqueles assuntos que a vida roubou de nós. E a gente só quis que aquele momento não parasse de acontecer, mesmo depois que o mar dormisse, que a chuva caísse, mesmo que nenhuma estrela se acendesse enquanto as horas se fossem. Que pudéssemos estar ali, tão nós dois de novo, sem romantismo, mas cheios de afeto. Os seus olhos e o meu cheiro, tanto passado e a intensidade voltando com eles. Os meus olhos e o seu cheiro, vontade de nunca mais deixar que nada morresse entre nós. Em cada palavra que eu dizia só havia a tentativa de justificar meu sumiço e dizer que não foi por maldade, que foi por cuidado e o desejo de preservar a única coisa que sobreviveu intacta após tanto desencontro.Em cada palavra que você dizia só havia a vontade do redirecionamento no fluxo dos sentimentos. Eu só lembro que eu quis voltar pra casa mais cedo quando te vi sendo engolido pela multidão. Eu quis voltar pra chorar tranquilamente, com privacidade e alguma mordomia sem saber exatamente se havia alguma dor: se era saudade pura ou aquela revisita ao teu olhar tão cheio de ternura, distância e melancolia. E depois era só aquela multidão sem você. E as minhas unhas sem esmalte, os meus olhos sem disfarce. E o nosso momento que parou de acontecer pra deixar o mar dormir em paz enquanto a chuva caía daquele breu sem estrelas. Você se foi com todas as nossas horas guardadas. Levando nos teus olhos um cheiro meu. E novamente o abismo que me separava de todos os nossos poemas. E eu chorei até dormir, abraçada no que ainda pulsava vivo de nós: um eco, um estilhaço de sol,um detrito de flor, a lembrança de um solo de violoncelo e o esqueleto de nenhuma esperança. (Marla de Queiroz)
Quando o coração sorri, a alma respira felicidade... Estou ligada num futuro blue.
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